STJ reduz a pena imposta ao ex-presidente Lula, defesa apresenta novos questionamentos

Advogados pedem a absolvição do ex-presidente e entendem que a Corte não analisou o mérito do processo

Lula terá que cumprir 17 meses para ir ao semiaberto; como já cumpriu cerca de 13 meses, faltariam 4 / Sergio Lima / AFP

 

Por unanimidade, quatro ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram reduzir nesta terça-feira (23) o tempo de pena do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no chamado "caso triplex", no qual o petista foi condenado em primeira e segunda instâncias. De acordo com a pena fixada, Lula terá que cumprir 17 meses para ir ao regime semiaberto – ou seja, faltariam quatro meses, e ele poderia deixar a carceragem em setembro.

Membro da Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (Renap) e mestre em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), Patrick Mariano afirma que a decisão do STJ "demonstra que houve um exagero" na pena imposta pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), em segunda instância. Ele, entretanto, defende que a revisão feita nesta terça (23) deveria ser mais profunda: "O correto seria anular o processo. Não há provas e há várias nulidades", ressalta.

Cristiano Zanin Martins, advogado do ex-presidente, entende que a Corte não analisou o mérito do processo. "Expressamos a inconformidade da defesa em relação ao resultado do julgamento, pois entendemos que o único desfecho possível é a absolvição do ex-presidente Lula porque ele não praticou qualquer crime", disse, por meio de nota. "Por outro lado, não podemos deixar de registrar que pelo menos um passo foi dado para debelar os abusos praticados contra o ex-presidente Lula pela Lava Jato. Pela primeira vez um Tribunal reconheceu que as penas aplicadas pelo ex-juiz Sérgio Moro e pelo TRF4 [Tribunal Regional Federal da 4ª Região] foram abusivas".

Um dos principais questionamentos de Zanin é que o fato de a defesa não ter sido autorizada a participar do julgamento por meio de sustentação oral. A ampla defesa é uma garantia prevista na Constituição de 1988 que deve prevalecer sobre qualquer disposição do Regimento Interno do Tribunal, segundo entendimento reafirmado pelo STF.

Zanin também afirma que a defesa não foi formalmente informada do julgamento do recurso nesta terça (23) e que não houve tempo hábil de 72 horas úteis para que os advogados se preparassem.

O julgamento

A defesa alegou que Lula responde por participar um esquema de desvio de recursos que beneficiava partidos, entre eles o PT. Na visão dos advogados, isso indicaria que a ação deveria ter se dado em âmbito eleitoral.

Félix Fischer, Jorge Mussi, Reinaldo Fonseca e Ribeiro Dantas votaram para que a pena total, que inclui as acusações de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, seja de oito anos, dez meses e vinte dias. A punição imposta pelo Tribunal Regional Federal da Quarta Região era de 12 anos e um mês. A multa por reparação de danos também foi reduzida: de R$ 29 milhões para R$ 2,4 milhões.

O ministro Fischer, relator do caso no STJ, havia rejeitado em decisão individual o recurso especial de Lula à Corte. A defesa, então, protocolou agravo regimental, para que a decisão de Fischer fosse derrubada e o recurso avaliado pela Turma.

Apesar da redução de pena, os ministros não acataram outros pedidos da defesa, como a absolvição por nulidades processuais e, de forma alternativa, a remessa do processo para a Justiça Eleitoral.

Os integrantes do STJ entenderam que parte das demandas não havia sido debatida nas instâncias inferiores, o que impediria seu exame pelo Tribunal. Em outros pontos, como a competência judicial de Sérgio Moro para conduzir o processo, reafirmaram decisões anteriores. Em relação à Justiça Eleitoral, argumentaram que nenhum crime eleitoral foi imputado a Lula, o que impediria a anulação do caso na Justiça Federal comum e sua remessa à Eleitoral.

Após o julgamento, a defesa de Lula afirmou que mantém sua convicção na inocência do petista, e que ele lutará para prová-la. "O líder de esquerda Luiz Inácio Lula da Silva está sendo julgado por inimigos, adversários naturais e históricos, que são seus adversários de classe", disse um de seus advogados, Emídio de Souza, que está em Curitiba (PR). "Esse julgamento tem um conteúdo político, segue tendo. Houve uma redução de pena, a previsão é que em setembro o presidente já estará na rua e vai poder ir para casa", finalizou.

Confira a íntegra da nota divulgada pelo advogado Cristiano Zanin Martins após o julgamento:

"Respeitamos o posicionamento apresentado hoje (23/04) pelos Srs. Ministros do STJ mas expressamos a inconformidade da Defesa em relação ao resultado do julgamento, pois entendemos que o único desfecho possível é a absolvição do ex-Presidente Lula porque ele não praticou qualquer crime.

Avaliamos que o Tribunal recorreu a formalidades inaplicáveis ao caso concreto e deixou de fazer um exame efetivo do mérito, como buscado pelo recurso. Não há elementos jurídicos para a configuração dos crimes imputados a Lula.

Lamentamos, ainda, que a Defesa não tenha sido autorizada a participar do julgamento por meio de sustentação oral. A garantia constitucional da ampla defesa deve prevalecer sobre qualquer disposição do Regimento Interno do Tribunal. Esse entendimento foi recentemente afirmado pelo STF ao admitir a realização de sustentação oral em agravo regimental interposto em habeas corpus.

Por outro lado, não podemos deixar de registrar que pelo menos um passo foi dado para debelar os abusos praticados contra o ex-Presidente Lula pela Lava Jato. Pela primeira vez um Tribunal reconheceu que as penas aplicadas pelo ex-juiz Sérgio Moro e pelo TRF4 foram abusivas.

É pouco. Mas é o início.

Esperamos que as instâncias que ainda irão se manifestar sobre o processo ajudem a restabelecer a plenitude do Estado de Direito em nosso país, porque isso pressupõe a absolvição de Lula e o restabelecimento da sua liberdade plena".

 

Edição: Daniel Giovanaz/Brasil de Fato

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